Tubarão aos 50: Como Spielberg Redefiniu o Cinema de Entretenimento
Há exatos 50 anos, um filme mudou para sempre a maneira como Hollywood entendia o suspense, o terror e o espetáculo. Tubarão (1975), de Steven Spielberg, inaugurou a visão moderna de blockbuster, ainda mais importante, ensina sobre economia narrativa, tensão psicológica e impacto cultural. Algumas lições ainda ecoam nas produções atuais, mas a precisão artesanal de Spielberg parece ter se perdido com o tempo em prol de escolhas comerciais.
O Nascimento do Blockbuster
De forma equivocada, alguns críticos e historiadores não consideram Tubarão o primeiro blockbuster por considerarem que isso iniciou com obras anteriores, como E o Vento Levou..., Ben-Hur e O Exorcista. É verdade que esses exemplares foram fenômenos de bilheteria. Porém, foi Tubarão que definiu o conceito de "arrasa-quarteirão" moderno. Não só por número de espectadores, mas transformando para sempre a relação entre audiência e cinema, o modelo de distribuição de filmes e praticamente toda a indústria hollywoodiana.
Antes de Tubarão, os estúdios não confiavam em lançamentos massivos em milhares de salas simultâneas. O filme de Spielberg, com sua campanha de marketing agressiva e uma estratégia de distribuição inédita, arrecadou US$ 470 milhões (um valor estratosférico para a época) e criou o modelo que dominaria o cinema nas décadas seguintes. Hollywood aprendeu que o evento era tão importante quanto o filme em si. Uma lição que hoje se desdobra, com muito menos virtuosismo, em franquias globais como Vingadores, Star Wars ou Jurassic World.
O Suspense que Nunca Envelhece
Contudo, o melhor planejamento de marketing não iniciaria uma época tão importante para o cinema sem qualidade. O pioneirismo comercial tinha em mãos uma obra-prima. Um filme inigualável com ou sem planejamento comercial. Os produtores certos encontraram a obra certa, aqueles acasos que fazem história. Mas o que faz Tubarão permanecer assustador cinco décadas depois? A resposta está na genialidade da sugestão. Spielberg, limitado pelos problemas técnicos do robô-tubarão (apelidado de "Bruce"), optou por mostrar menos e implicar mais. A sequência da morte do garoto Alex Kintner, em que o ataque é visto apenas pela agitação da água e pelo sangue, é um primor de montagem e som, graças à trilha icônica de John Williams. Em uma era de CGI excessivo, Tubarão lembra que o verdadeiro terror está no que o público não vê.
Personagens, Não Caricaturas
Diferente dos filmes de desastre dos anos 60 e 70, os queridinhos da audiência na época, Tubarão investe em personagens complexos. O xerife Brody (Roy Scheider) é um homem comum enfrentando o pânico; Quint (Robert Shaw) é um caçador obcecado, cujo monólogo sobre o USS Indianapolis é uma das cenas mais brutais do cinema, sem um único efeito especial. Hoje, quando muitos blockbusters priorizam ação sobre drama, Spielberg ensina que o público só se importa com o perigo se se importar com quem está em risco, lição que ele mesmo seguiu em outros grandes sucessos, como Indiana Jones, Jurassic Park e outros.
O Legado Paradoxal
Tubarão inaugurou a era dos grandes orçamentos e das expectativas desmedidas, mas também provou que popular e artístico caminham lado a lado. Spielberg tornou o cinema de autor (a câmera subjetiva do tubarão, os planos detalhados dos rostos em pânico) uma preciosidade de gigantesco apelo comercial. Cinquenta anos depois, mentes conservadoras de Hollywood parecem ter esquecido essa lição, ou desconhecem a própria história. Quantos blockbusters atuais ousam ter a paciência e a precisão de Tubarão?
Em um mercado saturado de reboots e efeitos digitais, o aniversário do filme é um convite a revisitar sua simplicidade genial. Porque, no fim, Tubarão não é sobre um monstro, mas sobre o medo do desconhecido. Isso, nenhum CGI pode comprar.
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